sexta-feira, 8 de abril de 2011

O passado me visitou


Não gosto de deixar o passado ocupar espaço, pelo menos não a parte ruim. Até que se for para expurgar fantasma, ainda vai, mas só me perturbar de graça, é uma merda. Minha filha foi fruto de um grande amor, idealizado, é verdade, mas amor. Um erro total amar quem amei, embora eu tenha sido amada na mesma intensidade. Mas nossos jeitos de amor eram diferentes, incompatíveis.

Hoje penso com tranquilidade que, se não fosse com ele, simplesmente a minha filha, tão amada, não existiria. E aí sinto que tudo, tudo tudo valeu a pena.

O preço foi alto, desperdicei anos da minha vida com culpas desnecessárias, nunca me vi cuidando e educando um filho sem a presença do pai, principalmente porque meu pai é o melhor que alguém pode desejar, amo os seus erros e os seus acertos. Talvez por isso, por tanta culpa que me impus, eu tenha me tornado comedora compulsiva. Acho que foi aí que esse porém começou. Mas isso já faz muitos anos, o que passou não importa mais.

Ficou a compulsão, bem que ela poderia ter ido embora quando decidi , ou quando consegui, me perdoar.

A compulsão não foi embora com o perdão, uma pena isso, mas não estou sozinha, há um mundo de gente com o mesmo problema e, felizmente, com técnicas para domar um pouco a situação.

Foi um erro porque o que havia de bom e bonito nele eu conheci bem, conheci o que ia no mais íntimo de sua alma, e havia bondade e amor., mas também havia feiura, talvez quase na mesma proporção.

Infelizmente, o lugar onde ele nasceu e cresceu, a educação que recebeu, as dificuldades que viveu, as amizades e o ambiente em si, tornam difícil, e muito, que ética, amor, bondade, educação e tranquilidade sejam predominantes. E fruto desse conjunto de merdas que ele viveu, somado às merdas que ele mesmo escolheu, formou-se um homem que podia ir da bondade à brutalidade, da ética à perversidade, da gentileza à total indiferença.

Não tento justificar aqui os erros dele, nem como homem e nem como pai. Apenas tento enxergar sob a ótica dele, sob a ótica do homem que uma vez vi desmoronar, e que o desespero e desesperança que eu vi em seus olhos nunca vou esquecer.

Logo que o conheci, várias informações que recebi, dele mesmo, eram falsas. Quando o descobri e vi sua alma, era tarde, estava apaixonada.

Um dos filhos dele (que eu só soube que existiam depois), e que ele sempre tratou com total indiferença, está preso. E foi essa parte do passado que me visitou sem ser convidada. Seu rosto, seu nome, foi dito em alto e mau som no noticiário. Minha filha viu e ouviu, e reconheceu o rapaz pelo nome, pois nunca esteve com ele. E ela chorou. E eu me senti invadida por sentimentos ruins, e tudo o que vivi de ruim chegou de uma só vez.

Revivi sentimentos há muito esquecidos, desesperança, medo, culpa, muita culpa, solidão. Mas logo no momento seguinte enxerguei onde estou, o que enfrentei e venci, o amor que sinto, e voltei a me sentir grata e feliz, e amada, e forte.

O pai da minha filha pagou e paga caro por suas escolhas. Sinto por isso, mas nada posso fazer. A vida me deu novas oportunidades de recomeço, de amar e ser amada. Minha filha é boa. Gente boa, com todas as letras. E feliz.

Eu estou com o homem que amo. Estou com o homem que quero definitivamente em minha vida. Não um santo ou um herói idealizado, mas com particularidades, virtudes e defeitos, assim como eu. Alguém que eu conheço a alma, e amo o que vejo.


A vida é em frente. Sempre.

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